terça-feira, 20 de maio de 2008

Exposição "Moradias Transitórias" – Museu Nacional / Brasília-DF

Chegar em Brasília já nos inspira questionamentos sobre a forma de se viver em grandes cidades. Como um organismo vivo, será que a cidade poderia ser planejada desde o seu nascimento?

Foto: Vinícius Ferraz
"Nasceu do gesto primário de quem assinala um lugar ou dele toma posse: dois eixos cruzando-se em ângulo reto, ou seja, o próprio sinal da cruz", assim definiu seu projeto o genial urbanista Lúcio Costa, que desenhou e construiu com mais dois gênios - o arquiteto Oscar Niemeyer e o engenheiro pernambucano Joaquim Cardoso – esta que talvez seja a maior obra do visionário Jucelino Kubisheck. Tanta realização e genialidade juntas não poderiam gerar nada que não fosse vitorioso.

Brasília, apesar de toda discussão em torno da sua viabilidade, funciona ao seus propósitos como capital nacional e já recebeu seus méritos como Patrimônio Mundial (UNESCO-1981) além do tombamento de suas obras pelo IPHAN (Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e do próprio projeto Piloto que também é tombado.


Foto: Vinícius Ferraz

Questionar sobre a frieza de um lugar planejado, sem referências expontâneas e as consequências de se morar em lugares assim inspirou a mostra "Moradias Temporárias" em exposição neste mês de dezembro no Museu Nacional de Brasília – uma das mais recentes obras de Niemeyer na Esplanada dos Ministérios. A mostra ainda divide os espaços com mais três exposições: "Gráfica Suíça 1950-2000" sobre a produção gráfica e artística daquele país; a mostra de lançamento do II Concurso Holcim Awards para moradias sustentáveis, e uma competente instalação para a mostra do Prêmio CNI Sesi Marco Antônio Vilaça de Artes Plásticas.

Interessante a exposição dessas três mostras juntas, porque falam do mesmo espírito de se questionar nossos valores contemporâneos de se viver e morar em grandes centros urbanos, e de como se dá a relação de todas as pessoas que vivem nesses grandes centros como naturais destes espaços, como imigrantes ou ainda retirantes. Como a fuga das pessoas de países e lugares pobres para países ou lugares mais ricos, e a fuga dos mais ricos para ilhas de construções cada dia mais isoladas e distantes do resto da população. O que leva os homens a esta aglutinação desenfreada, e quais as consequências destas super-povoações. As peças expostas vão a fundo nestas questões e nos remetem a repensar o conceito de casa como abrigo, ninho, casulo,caverna.... Levanta a aparição de novos valores, como as novas ordens familiares organizadas fora das relações formais de parentescos.
  
Onde hoje podemos ter uma tendência para condomínio fechados como forma de morar, temos também o conceito de moradias transitórias. Onde se coloca em risco a idéia de espaços presumidamente seguros. Surge uma cidade invisível às nossas retinas, transitória, ambulante, onde condena a arquitetura agressiva ao meio  ambiente, arquiteturas que isolam as pessoas ao invés de uni-las. As obras chamam atenção também para as pessoas que já buscam esse conceito como fuga, marginalizados e oprimidos; como a carroça que serve de residência. São críticas que apontam novos horizontes para nossa ocupação como cidadãos. E que mesmo escolhendo espaços convencionais para nossas residências nos fazem refletir sobre o futuro. 


Foto: Vinícius Ferraz

Não podemos nos conformar apenas com a lã que nos conforta a alma, é necessário olhar para o próximo, os que estão nas calçadas, nas ruas e nos lixões. E neste final de ano, podemos repensar um pouco como anda o crescimento de nossas cidades, que apesar de serem o reflexo de seus cidadãos, "cresce mais rápido do que a alma dos simples mortais" como diria Baudelarie.




Publicado na coluna Ambientes / Jornal do J.

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